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A Conquista de Ceuta - I

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

A conquista de Ceuta em 1415 marca o início da expansão portuguesa em África e tem fortes motivações económicas e de estratégia local. Ceuta era nos inícios do século XV a grande ameaça aos navios portugueses e à costa do Algarve. Ponto estratégico para o domínio da navegação no estreito de Gibraltar, com uma situação geográfica que a tornava facilmente defensável, base da guerra de rapina de corsários e de apoio ao Reino de Granada, Ceuta era principalmente um importante entreposto comercial, que escoava para a Europa as mercadorias que chegavam do Oriente através das caravanas e “o porto da navegação que se fazia entre os dois mares”.

Para a sua conquista, D. João I utiliza uma armada de 270 navios e cerca de 30.000 homens. O ataque é cuidadosamente planeado e mantido no máximo secretismo, sendo precedido pelo envio de espiões que estudam meticulosamente as suas defesas e determinam os seus pontos fracos.“No dizer do seu cronista, Azurara, seis anos antes já D. João I se ocupava dela; mas seguramente se sabe que se trabalhava para ela desde 1412”. Mas após a conquista a população abandona a cidade, e o bloqueio imposto pelo sultão de Fez inviabiliza o cultivo dos terrenos circundantes e o desvio das rotas comerciais para outros portos provoca o seu declínio.

“Ceuta tornou-se pouco mais do que uma grande e vazia cidade-fortaleza varrida pelo vento, com uma dispendiosa guarnição portuguesa que tinha que ser abastecida continuamente através do mar”.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

A importância da cidade é confirmada por Al-Hassan Al-Wazzan Al-Fasi, conhecido como Leão “o Africano”, que afirma na sua obra “Descrição de Africa” que Ceuta tinha 1.000 mesquitas, 360 casas de viajantes, 22 casas de banhos públicos e 103 moinhos.

“A primeira conquista no além-mar obrigou à preparação de uma frota capaz de transportar numeroso exército equipado com armas e abastecimentos. Foi necessário mandar construir, comprar e alugar muitos navios. As notícias da época registam galés, galeões, naus, barcas, fustas, cocas, e barinéis, entre outros…” Segundo Pisano, a armada era composta por “sessenta e três naus de carga, vinte e sete trirremes, trinta e duas birremes, e cento e vinte navios de outras espécies…”

A preparação da armada obrigou a um grande incremento a construção naval em Portugal. Só a cidade do Porto, com os estaleiros de Massarelos e Miragaia, “concorreu com setenta naus e barcas «afora outra muita fustalha», ou sejam embarcações de remo, como consta da carta passada por El-Rei D. Duarte àquela cidade”.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Luís Villalobos, no seu texto “A Conquista de Ceuta”, esclarece as características e funções dos vários tipos de embarcações utilizadas. “Em primeiro lugar, será necessário referir que as galés, movidas essencialmente a remos, podendo recorrer a velas, eram as embarcações militares por excelência, enquanto os navios de vela eram essencialmente de mercadorias. Os de vela eram lentos, difíceis de manobrar e muito dependentes de ventos favoráveis (…) apesar disso eram considerados auxiliares preciosos para uma armada, em especial os de maior tonelagem, de alto bordo, capazes de transportar muitos homens de armas. Daí que a maioria dos navios fossem naus, uma vez que não se previa um ataque naval, mas antes o transporte de tropas até Ceuta e seu desembarque para posteriores confrontos em terra.”

O exército era maioritariamente composto por veteranos da guerra contra Castela e muitos mercenários, alemães, ingleses, polacos e franceses. “Uma carta do alferes-mor do rei (João Gomes da Silva) ao arcebispo de Santiago indicava que, a bordo das 270 velas da armada portuguesa, deveriam seguir 7.000 a 7.500 «homens de armas», 5.000 besteiros e 20 ou 21.000 homens de pé (quer dizer, um total de 32 a 33.500 combatentes).”

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

A armada era liderada por D. João I, acompanhado pelo príncipe herdeiro D. Duarte e pelos infantes D. Pedro e D. Henrique, e por um seu irmão bastardo, o conde de Barcelos. Os principais responsáveis militares do reino estavam presentes, como o Condestável, D. Nuno Alvares Pereira, o Mestre da Ordem de Cristo, D. Lopo Dias de Souza, o almirante Carlos Pessanha, o almirante Micer (Meu Senhor) Lancerote, o capitão-mor Afonso Furtado, D. Pedro de Menezes, futuro governador de Ceuta, e muitos outros nobres, alguns dos quais iriam protagonizar os acontecimentos que marcaram a presença de Portugal em Marrocos, como Diogo Lopes de Souza, Vasco Coutinho ou Álvaro de Ataíde.

A expedição inicia-se no dia 25 de Julho de 1415 com a saída da armada da barra do Tejo. No dia 27, em Lagos, é finalmente anunciado o seu destino. A viagem entre Lagos e Ceuta é atribulada, já que uma forte tempestade obriga a armada a permanecer vários dias no mar alto. Ao dirigirem-se a Ceuta, os navios de carga são arrastados pelos ventos e correntes na direcção de Málaga, ficando os restantes à sua espera entre Tarifa e Calpe, mas acabam por se posicionar diante da cidade.

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Os mouros, apanhados de surpresa, tratam de reforçar as suas defesas com a colocação de engenhos no tramo Norte das muralhas, frente á praia, onde aguardam um desembarque dos portugueses. Das aldeias vizinhas afluem cerca de 10.000 voluntários. Durante os dois dias em que se aguarda a chegada dos navios de carga dão-se escaramuças na praia, provocadas pelos guerreiros mais aguerridos de um e outro lado _ mouros que saltam para bateis e arremessam pedras e flechas aos navios atacantes, portugueses que respondem desembarcando na praia para os combater.

Após a chegada dos navios de carga voltam a soprar ventos ainda mais fortes que arrastam toda a armada para o largo. Os mouros convencem-se que os portugueses desistiram do ataque e Salah Ben Salah, governador da cidade, dispensa os reforços que haviam chegado. D. João I chega a por em causa a campanha, mas no final permanece a decisão de atacar Ceuta. Quando a armada regressa, Salah Ben Salah já não pode contar com os reforços e simula a sua presença através da iluminação de todas as casas confinantes com a muralha.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

O plano delineado por D. João I consiste na concentração da maior parte dos navios frente à Ribeira, fixando o grosso das defesas mouras no local. Ao mesmo tempo, uma força menor seria colocada frente à Praia de Santo Amaro, onde se daria o desembarque das tropas.

No dia 21 de Agosto um contingente comandado por D. Duarte e D. Henrique desembarca na Praia de Santo Amaro, na base do Monte Abila, arremetendo contra os arrabaldes “de Baixo” e Zaklú, e evitando que os mouros encerrem a porta de Almina, que estabelecia a ligação com a cidade. A operação é bem-sucedida e as forças portuguesas penetram na cidade, conquistando-a de Nascente para Poente. Após percorrerem a Rua Direita, onde são surpreendidos por uma resistência moura que não esperavam, dá-se o segundo desembarque na Praia da Ribeira comandado por D. João I. A cidade está tomada.

Não é claro nas descrições de Mestre Pisano e de Zurara se o segundo desembarque se realiza no local do actual porto da cidade, se na actual Praia da Ribeira, onde os portugueses construiriam posteriormente a couraça das Muralhas Reais de Ceuta. Os textos referem que o desembarque se dá na Ribeira, mas não parece lógico que D. João I deslocasse o grosso da sua armada para a costa Sul, perdendo contacto com as forças desembarcadas em Santo Amaro.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Segue-se o saque. Lojas e habitações são assaltadas e pilhadas, lançando-se para as ruas mercadorias e bens destruídos, situação que Zurara descreve assim:

“Já passavam de sete horas e meia depois do meio dia, quando a cidade foi de todo livre dos mouros. (…) As outras Companhias [de soldados portugueses], não tinham maior cuidado doutra coisa que de apanharem o esbulho. (…) Muitos que se acercaram primeiramente naquelas lojas dos mercadores que estavam na rua direita, assim como entraram pelas portas sem nenhuma temperança nem resguardo, davam com suas facas nos sacos das especiarias, e esfarrapavam-nos todos, de forma que tudo lançavam pelo chão. E bem era para haver dor do estrago, que ali foi feito naquele dia. Que as especiarias eram muitas de grosso valor. E as ruas não menos jaziam cheias delas (…) as quais depois que foram calcadas pelos pés da multidão das gentes que por cima delas passavam, e de si com o fervor do sol que era grande, davam depois de si muy grande odor.“

Os habitantes são expulsos das suas casas. Muitos soldados cavam os pavimentos das habitações em busca de valores escondidos. No final do dia, na Mesquita Principal transformada em Igreja, planeia-se o ataque ao Castelo, ainda em poder dos mouros. Mas não haverá ataque, porque Salah Ben Salah consegue fugir com o seu séquito durante a noite.

 

In:http://historiasdeportugalemarrocos.wordpress.com/2014/04/30/a-republica-corsaria-de-bouregreg/#more-1855  (25/06/2014)

 

 

 

 

 

Naus portuguesas do século XVI, Museu Marítimo de Greenwich, Londres

Vista aérea de Ceuta . Em primeiro plano a Península Almina e o Monte Abila

Gravura de Ceuta em 1765 da autoria de Gonzalez, cartoteca digital da Biblioteca Nacional de Espanha

Carta do Estreito de Gibraltar da autoria de Santini, de 1780, cartoteca digital da Biblioteca Nacional de Espanha

Gravura de Ceuta no séc. XVI da obra Civitates Orbis Terrarum de Braun e Hogenberg, 1572

Esquema da conquista de Ceuta

Gravura de Ceuta em 1758, cartoteca digital da Biblioteca Nacional de Espanha

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