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A Conquista de Ceuta - II

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

No seguimento da tomada de Ceuta, D. Pedro de Meneses é nomeado governador. O exército e a armada retiram, deixando no local uma guarnição de 2.500 homens.

A população abandona a cidade, temendo represálias dos portugueses, que começam a ocupar as casas deixadas vagas. Do lado exterior a Poente das muralhas, junto à Porta de Fez, concentram-se uns milhares de pessoas que não arredam pé, chorando os seus familiares mortos que se amontoam nas praças da cidade. Durante os primeiros dias que se seguiram à ocupação, permanecem junto dos muros, dando luta permanente aos portugueses, que faziam surtidas esporádicas sem se afastarem em demasia. A zona era densamente arborizada e as ciladas eram uma constante. Muitas árvores foram então derrubadas, valados destruídos e mato queimado, com o objectivo de se criar uma zona de segurança com pelo menos uma légua de extensão, com boa visibilidade e sem condições para que os mouros se escondessem.

Ao fim de vinte dias a multidão começou a afastar-se, refugiando-se nas quintas e hortas circundantes. O conde D. Pedro de Menezes manda então construir várias atalaias, como a Atalaia da Porta de Fez e a Atalaia de Cima, torres edificadas em outeiros vizinhos, onde são colocadas as escutas, que vigiavam os movimentos do inimigo e alertavam para qualquer perigo. As atalaias davam também cobertura aos habitantes que saíam pelas portas em busca de lenha e frutas. Foram trazidos cavalos para Ceuta, já que os que tinham ficado após a tomada da cidade eram em número muito reduzido, aumentando assim o raio de acção dos portugueses e a eficácia dos seus ataques.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

A construção das atalaias e a chegada dos cavalos empurrou ainda mais os mouros para fora dos limites da cidade. Foram ocupar as encostas das Serras da Ximeira e da Gomeira e concentraram-se em aldeias e vales, como são exemplo os vales de Bulhões, Barbeche, Castelejo ou Negrão, onde se defendiam mais eficazmente das surtidas dos portugueses. O perímetro de segurança de Ceuta é aumentado para as vinte cinco léguas.

A guerra em torno da praça fez-se a partir de então de “almogaverias” ou correrias. “É a guerra de surpresas e de ciladas, aproveitando os acidentes do terreno ou a escuridão da noite.” Os“almogavares” tornaram-se numa força de elite em permanente actividade fora de portas, que fazia razias nas aldeias, roubando gado, destruindo colheitas e fazendo cativos. Eram também utilizados como força de vanguarda e de reconhecimento nas expedições de maior envergadura em que participava o exército regular.

No ano de 1418 o sultão de Fez cerca Ceuta durante cinco dias, sendo repelido pela artilharia e pelos besteiros portugueses. No ano seguinte dá-se novo cerco, desta vez com o apoio de tropas do Reino de Granada. D. Pedro de Menezes consegue avisar atempadamente D. João I, que envia uma força de auxílio. Após duas semanas de combates os sitiantes retiram com pesadas baixas.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

A política expansionista africana personificada pelo infante D. Henrique, foi uma política belicista que promoveu os interesses da nobreza, interessada na obtenção de riqueza através dos saques, anexações de territórios e do tráfico de escravos, em detrimento dos interesses da burguesia, baseados nas transacções comerciais e no mercantilismo.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Henrique inclusivamente manipulou as crónicas da época, escritas por Gomes Eanes Zurara, criando uma imagem ideal da sua pessoa, que foi transportada até aos nossos tempos, dando origem ao mito do “Navegador”.

Segundo André Bertoli, “A Crónica da Tomada de Ceuta é o relato oficial do ataque à dita praça marroquina. Tal Crónica foi iniciada em 1449 e terminada no ano seguinte, ou seja, 35 anos após a conquista de Ceuta. Como se pode notar, essa obra contém um discurso legitimador da política expansionista portuguesa empreendida após a conquista de Ceuta e um elogio a grandes nobres do reino, dos quais o Infante D. Henrique foi especialmente destacado.”

Nessa crónica, primeira obra do cronista, D. Henrique surge como o protagonista da operação, relegando para segundo plano o seu pai, o Rei de Portugal D. João I, os seus irmãos D. Duarte e D. Pedro.

“…O rei não foi um personagem de grande destaque na acção (…) foi narrado o ataque e conquista de Ceuta, onde o rei aparece como um personagem coadjuvante (…) o mérito da tomada de Ceuta na narrativa de Zurara recaiu, em sua maioria, sobre D. Henrique, reduzindo o papel de seus irmãos D. Duarte e D. Pedro, além do próprio monarca D. João.”

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Zurara constrói um perfil ideal para D. Henrique, que surge na crónica como um cavaleiro ao serviço da fé e da pátria, movido por valores e ideais cruzadísticos. O domínio de Henrique sobre Zurara explica-se facilmente por dois factos. Henrique era o último sobrevivente dos acontecimentos de Ceuta, não existindo ninguém para contestar a crónica, e Zurara fora contratado pelo próprio Henrique, que inclusivamente participara na elaboração do texto:

“Como se pode averiguar, Zurara foi feito cavaleiro e comendador da Ordem de Cristo pelo seu governador, o Infante D. Henrique. O que levou a conclusão de que esses dois personagens tinham relações em comum, na qual o cronista foi favorecido com um cargo importante dentro de uma ordem militar religiosa, enquanto D. Henrique ganhou papel de destaque em um dos escritos mais importantes do período, o que lhe aumentou seu prestígio como cavaleiro cristão português (…) no último parágrafo da página 43, (Zurara) afirmou que o Infante D. Henrique colaborou com ele ao relatar suas memórias.”

Como escreveu Oliveira Marques, “Parece estar bem estabelecido que, de todas as viagens que conhecemos, realizadas entre 1415 e 1460 (data da morte do Infante), só cerca de um terço foram devidas a iniciativas suas. Os outros dois terços deveram-se ao rei (D. João I, D. Duarte, D. Afonso V), ao regente D. Pedro, aos senhores feudais, aos mercadores e terratenentes vilãos, etc. (…) Este facto, sem obliterar o papel desempenhado pelo infante D. Henrique, reduz consideravelmente a sua chefia a uma dimensão mais humana e mais medieval.”

Bibliografia

BERTOLI, André Luiz . “Uma Leitura Possível da Crónica da Tomada de Ceuta, levando em conta a Representação do Infante D. Henrique nessa obra de Zurara” . Sociedade em Estudos, Curitiba, 2007

CRUZ, Abel dos Santos . “A Nobreza Portuguesa em Marrocos no Século XV (1415-1464)” . Porto 1995

FARINHA, António Dias . “Os Portugueses em Marrocos” . Instituto Camões 1999

LOPES, David . “A Expansão em Marrocos” . Editorial Teorema, Lisboa, 1989

MARQUES, A. H. de Oliveira . “História de Portugal” . Edições Ágora, Lisboa, 1973

PINHO, Roberto Correia . “Livro da Guerra de Ceuta, escrito por Mestre Mateus de Pisano em 1460″ . Academia das Ciências de Lisboa, Imprensa da Universidade de Coimbra, 1915

VILLALOBOS, Luís . “A Conquista de Ceuta” . Blog Conquista de Ceuta, 3 de Março de 2006

ZURARA, Gomes Eanes . “Crónica da Tomada de Ceuta” . Publicações Europa-América, 1992

ZURARA, Gomes Eanes . “Crónica do Conde Dom Pedro de Menezes” . Academia da Ciência de Lisboa 1792

 

 

In:http://historiasdeportugalemarrocos.wordpress.com/2014/04/30/a-republica-corsaria-de-bouregreg/#more-1855  (25/06/2014)

 

 

 

 

 

Armada portuguesa, Livro de Lisuarte de Abreu, 1565

As Muralhas Reais de Ceuta . Fosso de San Felipe

Planisfério de Cantino de 1502, Biblioteca Estense, Modena, Itália

O Infante D. Henrique na conquista de Ceuta num painel de azulejos de Jorge Colaço na estação de S. Bento, Porto

Arredores de Ceuta . foto de Diego Pérez

D. Henrique foi o grande vencedor com a conquista de Ceuta. Os poderes que recebeu na altura deram-lhe uma enorme força militar e “amplos rendimentos em moeda e em género”.

 “Com a decisão de manter Ceuta como domínio luso, em 1416 D. Henrique recebeu os cargos de vedor e superintendente dos negócios de Ceuta e da defesa marítima da costa algarvia contra a pirataria berbere, e para provê-lo dos recursos necessários para tal feito, D. João I, com anuência do papado, nomeou o Infante D. Henrique governador e regedor da Ordem de Cristo no ano de 1418.”

Oliveira Marques aborda o percurso de Henrique a partir da conquista de Ceuta e o enorme império económico que construiu. “As viagens de descobrimento, se podem ter interessado o infante D. Henrique (…) foram não obstante encaradas, antes de mais nada, como uma maneira de aumentar património e receitas, constantemente em maré baixa devido aos seus empreendimentos políticos e militares e à sua casa opulenta. (…) Tem interesse notar que muitos desses esforços se relacionaram com a pesca e actividades marítimas, incluindo a pirataria e a guerra de corso.”

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